Perante o aumento do número de empresas que, até agosto deste ano, recorreram a despedimentos coletivos, o diretor-geral da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), Rafael Alves Rocha, equacionou que a conjetura atual poderá ser "um sinal de alerta de que a resistência de muitas empresas portuguesas poderá estar a atingir o limite".
"O aumento do recurso a despedimentos coletivos registado nos últimos meses constitui um sinal de alerta de que a resistência de muitas empresas portuguesas poderá estar a atingir o limite, sob o efeito acumulado de aumentos incomportáveis de custos, do agravamento das condições de financiamento e de uma conjuntura externa particularmente adversa", apontou o responsável, em declarações ao Notícias ao Minuto.
Rafael Alves Rocha defendeu, por isso, que a par do alívio na carga fiscal é "absolutamente imperioso criar um ambiente regulatório favorável ao desenvolvimento da atividade económica, imbuído da maior flexibilidade, por forma a propiciar às empresas instrumentos que lhes permitam ajustar as suas atividades à volubilidade das circunstâncias nacionais e internacionais".
É que, recorde-se, os dados mais recentes disponibilizados pela Direção-Geral do Emprego e das Relações do Trabalho (DGERT) deram conta de que 318 empresas avançaram com processos de despedimento coletivo, pretendendo, num universo de 26.476 trabalhadores, despedir 4.178. Em termos de processos concluídos, 3.929 pessoas entre 4.190 foram efetivamente despedidas. Já em 2023, 372 empresas com um total de 22.417 trabalhadores pretendiam despedir 3.819 funcionários, tendo despedido efetivamente 3.622 pessoas.
"Tais números correspondem a um aumento de 27% do número de empresas que recorreram a despedimentos coletivos e de 79% dos trabalhadores abrangidos, face a igual período de 2023. Após a recuperação da atividade na sequência da contração decorrente da pandemia, regista-se hoje uma contínua desaceleração do crescimento económico", complementou Rafael Alves Rocha.
Entre as principais causas para este fenómeno está a "desaceleração agravada pelas consequências da guerra na Ucrânia, com forte impacto nos preços das matérias-primas e da energia, os quais desencadearam uma escalada na inflação", bem como a subida das taxas de juro por parte do Banco Central Europeu, "medida que agravou as condições financeiras das empresas e dos particulares".
"Todos estes desenvolvimentos afetaram diretamente as empresas portuguesas e conduziram a uma conjuntura internacional adversa, com a estagnação, ou mesmo contração, de muitos dos mercados de destino das exportações portuguesas. Entretanto, surgiu também a crise do mar vermelho, o conflito armado no Médio Oriente, a crescente tensão comercial entre os Estados Unidos e a China", sublinhou.
Na mesma linha, o responsável apontou que "esta situação não foi contrariada pela política económica", sendo que "as empresas continuam sujeitas a uma elevada pressão fiscal e parafiscal e a um ambiente de negócios desfavorável ao desenvolvimento da sua atividade".
"No segundo trimestre de 2024, o crescimento em cadeia do PIB reduziu-se para 0,2%, não havendo perspetivas de melhoria no terceiro trimestre. Particularmente preocupante é a situação na indústria transformadora, cuja produção tem contraído, de forma persistente, nos últimos seis meses, acompanhando uma evolução similar na área do euro e, em particular, na Alemanha, sem expectativas de melhoria a breve prazo", disse.
Ainda assim, este abrandamento da atividade económica não se tem refletido no mercado de trabalho, uma vez que se têm atingido "máximos históricos" a nível de empregabilidade, apesar de haver "algum abrandamento na criação de emprego".
"Esta evolução tem permitido a absorção quase total do aumento da população ativa resultante de saldos migratórios positivos. Uma exceção a este quadro é a da indústria transformadora, setor em que verificamos uma redução do emprego (-2,4% entre o primeiro e o segundo trimestre deste ano)", reforçou.
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