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Vozes ao Minuto: "Cheque-psicólogo é medida compensatória. Não resolve todas as situações"

Vozes ao Minuto: O Bastonário da Ordem dos Psicólogos, Francisco Miranda Rodrigues, é o convidado desta terça-feira do Vozes ao Minuto.

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© Reprodução OPP

Teresa Banha
01/10/2024 09:01 ‧ 01/10/2024 por Teresa Banha

País

Cheque-psicólogo

O Governo disponibilizou, a partir de segunda-feira, 100 mil cheques-psicólogo para alunos do Ensino Superior, numa medida que contempla a disponibilidade de cerca de 300 especialistas.

 

O pedido de consulta poderá ser feito através do site do Executivo, e os alunos podem mesmo escolher qual o profissional com quem querem marcar uma consulta.

Notícias ao Minuto falou com o Bastonário da Ordem dos Psicólogos, Francisco Miranda Rodrigues, que classificou esta medida como "compensatória" e reforçou que só com o complemento do Serviço Nacional de Saúde esta medida será completa - e que neste terreno "estamos longe" de uma resposta.

Explicando o que está em causa com esta medida e dando conta da existência de fatores de exclusão - e explicando o porquê dos mesmos -, o especialista faz um retrato do que esperar no âmbito desta 'luz verde'.

O cheque-psicólogo não resolve todas as situações, mas é uma forma de contribuir para isso

A idade da maioria dos alunos que ingressa no Ensino Superior ronda os 18 anos. Em que medida é importante a intervenção profissional nestas idades?

A evidência científica aponta precisamente estas idades como sendo aquelas em que que grande parte das perturbações mais comuns se desenvolvem e aparecem. Portanto, esta idade ganha uma particular relevância devido a isso.

Depois, existem desafios e crises de vida nesta fase que estão muito ligados à etapa de desenvolvimento em causa. Aqui estamos a falar de jovens em construção. No caso dos que estão num curso superior, dos jovens que fazem um processo de autonomia e de passagem para a vida adulta. É um momento de desafios muito particulares em que é necessário que certo tipo de competências sejam desenvolvidas. No caso dos jovens que ingressam no Ensino Superior, que são alvo desta medida, há a questão da adaptação a este novo momento de aprendizagem, que é muito mais do que um momento de aprendizagem escolar - e é por isso que já não nos referimos a ele como escola.

O que o distingue?

Envolve outras dimensões sociais e já de preparação para uma futura integração social, no trabalho, e que exigem bastante mais do que conhecimento académico. Há, portanto, as competências transversais, facilitadoras, algumas delas socioemocionais, como é o caso da regulação emocional e do trabalho em equipa, ou a comunicação interpessoal -  que são muito importantes não só para o sucesso educativo, como para a adaptação nesta fase e para outras dimensões da vida, nomeadamente, em termos profissionais.

[Estas dimensões] são cada vez mais valorizadas e fazem cada vez mais a diferença no mercado de trabalho. E também o facto de muitas vezes este ser um tempo de exploração também mais próximo do que são as oportunidades de trabalho para as quais se sente uma vocação. Assim, também a exploração às vezes mais aprofundada em termos vocacionais e de carreira nesta fase ganha particular importância.

Há este conjunto de desafios, como novas relações amorosas, já numa fase diferente, ou adaptações a novas cidades, quando é o caso. É um tempo de vida claramente diferente. E estas características fazem desta uma fase com especificidades que exigem que se tenha uma particular atenção a estas dimensões.

E é também verdade que o acesso a psicólogos não é fácil para a maioria da população - não sei se é para a maioria da população que está no Ensino Superior, mas sabemos que, de uma forma geral, há uma maioria que não tem acesso a estes serviços. Sabemos que a espera nos serviços de Ação Social ou nos Serviços de Apoio ao Estudante - depende de onde estão inseridos os psicólogos - é uma espera geralmente grande também. E todos os estudos que têm sido feitos sobre sintomatologia, nomeadamente, ansiosa e depressiva, também apontam para níveis elevados nestas idades.

Há um conjunto de fatores muito relevantes que justificam que se dê e melhore as respostas e o acesso aos serviços prestados pelos psicólogos.

Para as pessoas que têm recursos financeiros há resposta, porque vão ao privado comprar recursos

É aqui que entra o cheque-psicólogo?

O cheque-psicólogo é uma forma de contribuir para isso. Não resolve todas as situações, mas é uma forma de contribuir para isso. É uma medida compensatória, complementar e, no fundo, compensatória da inexistência de capacidade de respostas noutros locais. É claro que para as pessoas que têm recursos financeiros há resposta, porque vão ao privado comprar os recursos. Há quatro milhões de portugueses com seguros de saúde quem têm um bocadinho mais de facilidade de acesso através do seguro de saúde. Ainda assim, uma resposta universal para todos os portugueses e portuguesas seria o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e aí estamos longe - muito longe - de conseguir dar essa resposta.

No âmbito deste protocolo estão previstas 12 consultas: duas de avaliação e diagnóstico e dez de acompanhamento. O acordo prevê a reavaliação e prolongamento das sessões, mas estas 12 consultas são suficientes?

Aqui não houve uma limitação do ponto de vista orçamental, político ou do género. E não foi uma adivinhação. O número parece-nos adequado porque o que fizemos foi seguir o que a evidência científica aponta para números médios, com algum desvio - para aquilo que são este tipo de situações que o cheque abrange. Claro que existem situações que saem fora destes padrões, dado que este é um número médio, e daí estarem previstos mecanismo para lidar com essas situações. 

Era necessário fixar um determinado número. Para estar organizado o sistema tinha, necessariamente, de ter algumas limitações. Limitações que foram indicadas por nós, e com base naquilo que é a evidência que existe atualmente. Todos com a consciência de que isto são números médios e se assim é, podem sempre acontecer situações que exijam ir para além disso - e é por isso é que é necessário haver mecanismos que possam criar respostas para esses casos, que foram acautelados.

Devemos sempre desconfiar das medidas simples para problemas complexos

Este é um caminho que começa a ser trilhado e não se pode fazer tudo de uma vez, mas a seu ver seria importante também haver outro tipo de passos ou acompanhamento (seja em 'cheques' ou outras soluções) logo, por exemplo, nos primeiros anos de escolaridade?

Até de uma forma mais multifacetada e multidisciplinar, não necessariamente só os psicólogos. As intervenções nos primeiros mil dias têm uma evidência bastante robusta em relação aos impactos na vida adulta das pessoas que usufruem destas intervenções face às que não usufruem.

Há investigação longitudinal entre os países que demonstra isso. A questão é que se tem de ter algum cuidado porque o cheque-psicólogo, podendo parecer uma medida relativamente simples, tem esta atratividade por ser uma medida simples - mas devemos sempre desconfiar das medidas simples para problemas complexos.

É uma medida que tem limitações - por isso é que dizemos que é um contributo. É uma medida que não pode responder a imensas coisas.

Como por exemplo?

A intervenção multidisciplinar significa que existe a intervenção de vários profissionais que trabalham numa equipa - não necessariamente psicólogos. Psicólogos e outros profissionais. O cheque-psicólogo não responde a isso.

A par do acordo deste acordo, o Governo fechou também um outro com a Ordem dos Nutricionistas. E se pensarmos numa questão de ansiedade que leva a uma diminuição de peso?

Imaginemos que estamos a falar de uma coisa destas. Estando a trabalhar individualmente através de uma medida tipo cheque-psicólogo, o psicólogo não está a conversar com o nutricionista e a trabalhar em conjunto com ele. Isso só é possível quando acontece numa estrutura institucional que tem os profissionais para fazer o trabalho multidisciplinar.

Se estivermos perante uma situação de dependências de substâncias, é necessária a intervenção de uma equipa multidisciplinar, por exemplo.

O Serviço Nacional de Saúde é o único que - se tiver os recursos - dá uma resposta a todo o tipo de problemas


Há fatores de exclusão neste projeto e essa é uma deles é esse mesmo, mas não só. Diagnósticos de bipolaridade, estudantes que apresentem tentativas de suicídio prévias ou risco de suicídio. Estes são fatores de exclusão a este cheque. Porquê?

Porque não é possível em acompanhamentos que não tenham a intervenção de outros profissionais, por exemplo, médicos. Elas exigem intervenção de psicólogo, psiquiatra ou de médico, enfermeiro por vezes. Há outros profissionais que têm de estar envolvidos para que se possa ter uma intervenção com resultados efetivos. Portanto, não podemos estar a fazer de conta que é possível, isoladamente, com uma medida dessas, dar conta dessas situações.

Por isso nós temos dito isso e isso foi algo que foi dito ao Governo desde o primeiro momento. Esta medida para nós é positiva desde que ela seja, antes de mais, complementar. Complementar, no fundo, às respostas que não deixam de ter de existir e serem reforçadas. Ou seja, reforçando o número de psicólogos nas equipas existentes nas instituições de ensino. E algumas ainda não têm sequer psicólogo. Aí, é preciso reforçar bastante. Há um programa que transita do governo anterior e que este Governo assumiu que será para implementar e que ainda não está no terreno - que é um programa que vai financiar 40 instituições de Ensino Superior precisamente para a contratação de psicólogos. Esse programa é financiado pelo Plano de Recuperação e Resiliência e, devido a algumas questões burocráticas do próprio programa, ainda não se iniciaram as contratações dos psicólogos e já estamos a iniciar o ano letivo.

Este atraso é de quanto tempo?

Não sei. Terá de ser o Governo a responder. Nesta altura, os psicólogos já deviam ter sido contratados, já deviam estar a trabalhar e não estão. Atrasado está. Quando vai ficar resolvido, não tenho informação. E não sei se o Governo tem certezas sobre isto, e provavelmente, isto vai variar de instituição de Ensino Superior para instituição. Houve instituições que tiveram mais capacidade para fazer face a esses obstáculos mais administrativos do próprio processo que está envolvido aqui para receber o financiamento. Portanto, em princípio até haverá diferenças entre as instituições. Eu não tenho conhecimento de que neste momento haja alguma que já esteja mesmo com os psicólogos contratados. Para além disto, há um contexto por excelência para as intervenções clínicas porque a principal função destes psicólogos do Ensino Superior não será fazer intervenção clínica no contexto do Ensino Superior. A sua principal função é precisamente dedicarem-se a programas que possam prevenir estas situações.

O que estou a querer dizer é que o cheque-psicólogo enquanto pedido complementar, muito bem. Mas é complementar a quê? Complementar, por exemplo, a este programa a que me estou a referir e que ainda não está no terreno.

Sabemos que existem taxas de abandono que são demasiado elevadas no Ensino Superior, acima dos 10% - e, por isso, é necessário que haja programas de integração. O cheque-psicólogo não substitui de maneira nenhuma e em nada o trabalho que estes profissionais vão fazer, integrados numa instituição e que vão ser trabalho preventivo. O trabalho do psicólogo no cheque-psicólogo é um trabalho que não é de prevenção primária. É para alguém que tem um problema, quer o apoio do psicólogo e que recorre. Os casos dos psicólogos que vão fazer intervenção no Ensino Superior [no tal programa] começa antes do problema.

Começa a tentar ajudar a que os estudantes possam não vir a ter problemas que necessitem da intervenção dos psicólogos mais tarde em termos clínicos, que possam adaptar-se mais facilmente ao ensino e possam ter mais sucesso educativo, que possam não abandonar tanto os cursos onde entram. É isso que esse programa vai essencialmente incidir. E as duas coisas são complementares. Não há forma de o cheque-psicólogo alguma vez substituir este tipo de programa.

E depois, o contexto adequado e multidisciplinar para a intervenção clínica sem limitação, digamos assim, do âmbito dos problemas, chama-se Serviço Nacional de Saúde. É o único contexto universal e que, em patamares diferentes, dependente da gravidade das situações, consegue, se tiver os recursos, dar uma resposta a todo o tipo de problemas. Para isso, significa que tem de haver um reforço muito substancial do número de psicólogos no SNS, particularmente nos centros de saúde. E por isso é que dizemos que o cheque é complementar - não tem forma de substituir a interveção que pode e deve ser feita a este nível no Serviço Nacional de Saúde.

O caso do cheque-psicólogo serve para situações individuais, que podem ter a ver com situações de desenvolvimento de carreira, mas que também podem ter de ver com outras questões - como crises de vida. Alguém que tem a morte de um familiar naquela altura, alguém que está com dificuldades num relacionamento social, fazer novos amigos ou relações amorosas. São tudo processos comuns que não tem a ver com perturbação, mas que causam sofrimento, inadaptação, insucesso e que podem ser atendidos no âmbito do cheque-psicólogo.

A mesma coisa para a perturbações mentais comuns - ou seja, ansiedade e depressão. Alguém que tem o diagnóstico de uma perturbação de ansiedade está abrangida pelo cheque-psicólogo porque está dentro das perturbações mentais comuns. Mas se estivermos a falar de uma perturbação mental grave [bipolaridade], já não está incluída.

Para além da existência de equipas multidisciplinares, também é importante por isso um acompanhamento nos 18 anos anteriores.

É também por isso que dizemos que a medida é temporária. Não significa que o Governo não possa vir a decidir que pretende dar continuidade à medida ou até alargá-la, em termos de população. O Governo pode decidir por isso tendo em conta na mesma as limitações que a medida tem. Mas todos temos consciência de que se o sistema desse resposta através das respostas estruturais, não seria necessário estar a lançar uma medida destas. O Governo pode sempre decidir que prolonga a medida porque considera que, depois de avaliá-la, desta forma, tem uma resposta melhor e que faz um conjunto de respostas mais forte do que a resposta que conseguiu até agora desenvolver nas infraestruturas públicas existentes. Mas nunca se conseguem substituir.

No fundo, acabam-se por tratar aqui novos casos e não casos mais profundos?

É mesmo uma questão de impossibilidade técnica e de poder fazê-lo com efetividade sem ser com a intervenção de outros profissionais. Sendo o Estado a entregar um cheque para que a pessoa vá ter aquele apoio, é estranho estar a entregar para ter um apoio que o Estado já sabe à partida que aquele apoio não é suficiente porque vai precisar de um outro profissional. É essa a razão de alertarmos para e o porquê de esta medida não ser universal.

Em relação às respostas mais cedo, aí é mesmo preciso intervenção multidisciplinar naquela que é a mais efetiva de todas, que é a resposta dos mil dias.

E em relação às escolas?

As escolas já têm neste momento profissionais com um rácio  que, não sendo ainda o ideal, já é muito próximo. A situação em comparação com o Ensino Superior, em termos de respostas, é muito melhor. Se o Governo tem de decidir se vai para as escolas ou Ensino Superior, é natural que escolha o Ensino Superior. Muitas escolas já têm equipas multidisciplinares.

Mas, existindo tantos fatores de exclusão no 'cheque', algo não está a funcionar até aí - seja o SNS, sejam essas equipas.

O SNS é a grande questão. E é aí que temos insistido porque podemos criar medidas compensatórias - como o 'cheque' -, mas os psicólogos andam a fazer coisas cujo local indicado para as fazer não é esse.

Como assim?

Andam a fazer intervenção clínica quando esta não deve ser feita na escola. E isto acontece porque não há respostas no SNS. E as famílias que não têm outros recursos recorrem a quem tem perto. E quem têm ao pé ou está na autarquia ou na escola - porque hoje também há cada vez mais psicólogos nas autarquias. Há autarquias que já têm gabinetes para atenderem. Há muitos psicólogos a trabalhar ao nível comunitário que fazem intervenção clínica a esse nível. Ainda assim, com uma limitação quando é assim, porque lá está as equipas multidisciplinares que eu disse que existem nas escolas não são as equipas multidisciplinares que existem na saúde. É importante que existam, mas servem para outra coisa. A saúde é a saúde. E é no contexto da saúde que algumas coisas têm de exister. Enquanto não existirem, estamos sempre a tentar compensar com outras coisas - mas não faz o mesmo, não tem a mesma resposta, não está a fazer a mesma coisa. O SNS é essencial.

As coisas não começaram agora, mas, neste momento, já começamos a ver alguma coisa de um ponto de vista mais palpável

A questão de o cheque ser uma medida compensatória foi abordada?

Desde o primeiro dia. Deve ter sido a primeira coisa que disse em resposta à proposta feita pelo Governo. Se há coisa que temos feito permanentemente é o alerta relativamente às condições de escassos recursos de alguns serviços públicos. E o Governo comprometeu-se expressamente - e não só se comprometeu como já temos evidências disso na prática - a fazer algumas das coisas que dissemos que eram condições necessárias relativamente a esta complementaridade.

Que tipo?

A primeira das coisas foi que não houvesse qualquer retrocesso, mas que, pelo contrário, houvesse um contínuo avanço, na consolidação dos psicólogos existentes nas escolas e, inclusive, em relação às condições - atualmente muito precárias - em que exercem essa atividade; que não podia haver um retrocesso em relação ao número de psicólogos existentes nas escolas e às suas condições de trabalho. E isso já está a acontecer. O Governo fez a recondução de todos os psicólogos nas escolas e está a trabalhar numa solução para a vinculação definitiva destes profissionais.

A recondução já aconteceu, e há um compromisso público em relação à questão da vinculação de psicólogos nas escolas.

E que outras condições?

Para o Serviço Nacional de Saúde. Logo que a ministra da Saúde tomou posse nós fizemos saber a nossa preocupação publicamente sobre a continuidade de processos que estávamos a gerir com a Direção Executiva do SNS anterior e que tinham sido já garantidos pelo anterior Governo também. Estes processos estavam à beirinha de finalmente verem a luz dia. Faltava, basicamente, avançar para os concursos dos piscólogos - porque o processo de desburocratização para permitir contratações céleres de piscólogos pelas Unidades Locais de Saúde tinha sido concluído pelo Governo anterior e pela Direção Executiva anterior.

A ministra garantiu-nos - por mais do que uma vez - que iria dar sequência a isso e tivemos depois de facto uma confirmação pelo senhor primeiro-ministro, quando anunciou, no âmbito do Plano de Emergência e Transformação na Saúde, a contratação para os centros de saúde como medida urgente.

Essa medida não está ainda concretizada, mas já está neste momento, em concretização. Já existem Unidades Locais de Saúde que lançaram os concursos. Que eu saiba, não há contratações em lado nenhum, mas o lançamento de concursos já começou a acontecer em cada uma dessas unidades.

Em que zonas do país?

Houve o lançamento de um concurso em Guimarães e terá havido também no Baixo Alentejo. Pelo menos estas duas sei que já tiveram lançamentos. Não me recordo do nome de outras, mas estas tenho a certeza. De uma forma geral as contratações ainda não estão a acontecer e foram lançados cerca de metade dos concursos.

Não estamos a falar de algo só do campo das promessas, as coisas estão de facto a avançar. Há indicadores: não só de compromisso face àquilo que era a necessidade complementaridade, como evidência de que se pretende fazer esse caminho.

Esperemos agora pela proposta do Orçamento do Estado, mas já tenho informação de que há intenção por parte do Governo de continuar a fazer este reforço para o próximo ano - o que é uma ótima notícia.

Em que medida?

Há muito tempo que reivindicamos que haja uma continuidade do reforço. Porque ao longo de cinco ou seis anos resolveríamos este problema. Se tivéssemos começado há cinco ou seis anos a fazer isto, hoje em dia já não estávamos a falar assim, em termos do SNS. Foi o que foi feito nas escolas. Ao longo de cinco ou seis anos, as escolas quase resolveram a questão. Estou convencido de que não resolveram totalmente por duas razões: primeiro, tivemos uma pandemia pelo que agravou a situação toda. Segundo, porque ao mesmo tempo o SNS não acompanhou em termos de resposta e as escolas passaram a fazer uma coisa que não deviam estar a fazer. Se escolas pudessem ter começado há cinco ou seis anos com estes números, e começar a fazer trabalho meramente preventivo, já estaríamos com uma situação diferente. Mas mais vale tarde do que nunca. As coisas não começaram agora, mas, neste momento, já começamos a ver alguma coisa de um ponto de vista mais palpável.

Ou seja, num cenário ideal, até 2030 seria possível ter todos estes problemas resolvidos - falta de psicólogos no SNS?

Mantendo todas as variáveis como elas estão hoje, sim. Hoje sabemos que quando propusemos há sete ou oito anos a contratação faseada ao longo de quatro ou cinco anos de psicólogos, num determinado número... Olhando para trás, sabemos que se isso tivesse feito teríamos hoje uma capacidade de resposta completamente diferente e, muito provavelmente, em muitas zonas do país já não teríamos um problema. O que não quer dizer que fazer exatamente a mesma coisa nestes cinco anos ou seis seja igual - porque o mundo não está igual. Vamos ver como evoluem as coisas nesse sentido.

É uma coisa de cenários, mas há uma coisa de que temos a certeza: a situação seria muito melhor hoje [sem ter havido a pandemia]. Teríamos menos tempos de espera, teríamos muito mais gente que conseguia aceder aos serviços e isso não tenho qualquer dúvida em afirmar. É importante que se continue a fazer também o trajeto que se tem feito em termos de organização. Não é só o número que fará tudo. Sem ovos não há omeletes, e depois é preciso saber fazer a omelete. A organização dos serviços de psicologia nas unidades de saúde, por exemplo, é questão muito relevante, que tem evoluído muito positivamente, mas ainda não está consolidado - ou seja, serviços devidamente geridos de acordo com este modelo com que os psicólogos trabalham, com indicadores de qualidade, de produção também - mas de qualidade -, e que dão resposta a toda a érea da saúde e não só à área da doença mental.

Numa altura em que as redes sociais fazem cada vez mais parte do dia a dia dos jovens, qual o impacto nas escolas?

A evidência demonstra que o bem-estar e a saúde mental estão relacionados. É um ciclo. As coisas estão interrelacionadas e, portanto, há correlações para um lado e para o outro. O insucesso educativo também leva ao sofrimento, perda de bem-estar e a problemas de saúde mental. Os problemas de saúde mental, ou perturbações, como forma mais grave, ou a falta de bem-estar, de uma forma geral, prejudicam o sucesso educativo.

Das mesma forma que sabemos que as condições sociais, como por exemplo, a condição de pobreza, também têm um ciclo com a saúde mental. Ou seja, pessoas com problemas de saúde mental têm um maior risco de pobreza e as pessoas que estão numa condição de pobreza, têm mais risco de desenvolverem problemas ao nível da saúde mental.

Leia Também: 'Cheques' de consultas no Superior: De como funciona a quem fica de fora

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